Já sei que vou ser criticada. Já sei que inúmeros, senão todos, não vão concordar comigo. Vão até estranhar-me. Vão até insultar-me baixinho...
Não concordo com a vinda do apelidado barco do aborto. Não concordo com as petições a favor da sua entrada. Não concordo com as senhoras de feminilidade questionável a baterem com a mão no peito clamando histericamente o direito a fazerem o que entendem com as suas barrigas.
Não entendo as vozes caladas, a omissão de manifestações contra as condições de saúde neste país. Não entendo as comemorações e histeria colectiva perante o Euro 2004 e as consequentes gastos de fundos para estádios estéreis cujos montantes dariam para erigir melhoras nas condições de vida dos portugueses. Porque não foram para a rua e assinaram petições nessa data? Porque é que não há revolta contra a falta de médicos nas periferias e consequentemente contra a falta de contracepção e planeamento familiar? Porque não existem petições para reforço de abono de família e ajuda a famílias carenciadas? Porque não se reforçam as inspecções ao rendimento mínimo (agora tem outra denominação...) e se atribui o mesmo a quem de facto do mesmo necessita?
Porque não revoltam as pessoas contra as mulheres que imprudentemente e sem qualquer tipo de lacuna socio-cultural-economica, utilizam o aborto imprudentemente, inconsequentemente e sem qualquer respeito pela vida?
Porque é que nunca se soube fazer um debate decente sobre a questão do aborto, alertando, com imparcialidade, com competência e com conhecimento, para todos os prós e contras do recurso e descriminalização deste crime?
Não me venham dizer que não há a porra de vida, porque há inquestionavelmente vida! Digam-me antes que poderá haver ponderação e conflito de interesse...em casos pontuais, meus senhores, porque existem milhares de abortos praticados, como disse, de forma brutalmente imprudente, inconsciente e criminosamente anti-concepcional!
Não me venham dizer que deverá ser descriminalizado dando assim de bandeja a possibilidade de se recorrer a ele da referida forma irreflectida! Não temos a suficiente, sequer a mínima, cultura ou mentalidade, ou condições para que isso aconteça!
Em boa verdade até o aborto eugénico é arrepiante...em boa verdade, quem somos nós para determinar que uma criança, por ser portadora de deficiência, não tem direito à vida que lhe concedemos ab initio?
Arrepiam-me todas as vozes com certezas neste assunto: Todas sem excepção. Porque todos terão razões, mas porque todos, inclusive eu, falamos de algo que, permitam-me, é sagrado e nós, sem duvida, somos obscena, profunda e demasiadamente profanos.
Não assinarei qualquer petição e pelos mesmos motivos não concordo com a vinda do barco do aborto. Não serão totalmente legais os motivos aduzidos pelo governo, de facto, a mera prognose de no mesmo de poder vir a realizar o aborto, não é causa justificativa e oponível à livre circulação de cidadaãos CE. Todos nós podemos no instante seguinte praticar um crime, e apenas em filmes de Spilberg, podemos ser presos antes da pratica do mesmo.
Outros fundamentos no entanto existiriam.
A mim penalizo-me, a vós penalizo por nunca verdadeiramente nos termos debruçado sobre a imensidão da problemática do aborto. A todos nós atiro pedras pela hipocrisia. A muitos atiro a primeira pedra por utilizarem mais uma vez um assunto de melindre inquestionável para questões políticas. A isenção está muito longe do tema e isso é uma pena.
E por favor não me venham com o argumento de que sendo criminalizado ou punido se continuará a praticar, porque então, por via desse argumento falacioso todos os crimes praticados diariamente deveriam, na mesma ordem de ideias, ser igualmente despenalizados.
Também não me falem em direito da mulher, pois estou certa em lugar algum uma mulher que pratique aborto o encarará como um direito!
A propósito eu votei a favor no referendo.Perdoem-me mas hoje não sei se o faria.